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A luta LGBTQIA+ também faz parte da luta ecossocialista. O futuro deve ser diverso!

A importância da data

Em 28 de junho é marcado o Dia Internacional do Orgulho LGBTQIA+, data firmada em 2015 diante da celebração dos 46 anos de Stonewall. Numa madrugada do final dos anos 60, exaustes de se submeterem aos desmandos da polícia que intimidava e efetuava prisões alegando “condutas imorais”, um grupo protagonizado por Marsha P. Johnson, mulher negra e trans, e Sylvia Rivera, mulher trans com ascendência venezuelana e porto-riquenha, partiram para o embate, o que desencadeou uma série de outros protestos.

Imagem em preto e branco.
À esquerda, Marsha P. Johnson usando um chapéu, camisa, saia na altura do meio das coxas, uma bolsa de mão e um tecido caindo ao lado do corpo. Sorrindo.
À direita, Sylvia Rivera com cabelos curtos na altura dos ombros, mão no rosto e um macacão de corpo inteiro. Está segurando o cabo de uma bandeira.
Atrás delas, pessoas apoiando o protesto.
Marsha P. Johnson e Sylvia Rivera marchando pelos direitos da comunidade LGBTQIA+

A história nos mostra que o levante da comunidade não partiu dos homens brancos gays de classe  alta, mas sim da parcela vista como escória social: negras, imigrantes, trans, pobres, trabalhadoras sexuais. Curiosamente – ou nem tanto diante do sistema capitalista em vigor –, essa história é apagada e a data focada na parcela privilegiada da população que celebra o amor e o orgulho.

A bandeira do orgulho deixou de ser levantada por quem é queer (termo inicialmente utilizado de forma pejorativa a LGBTs, associados a estranhos), mas sim pelas marcas e mídias. A parada LGBT de São Paulo é um dos eventos que mais rende lucro à prefeitura e atrai pessoas de todo o mundo. Quando verificamos a composição deste público percebemos novamente gays brancos não afeminados com poder aquisitivo. Bom, quem tem direito de celebrar o dito orgulho?

Não por acaso o mês de junho é cercado de publicidade, o pink money está em alta. Por outro lado, essas mesmas empresas negam empregos ou atendimento digno. Outra ironia é o fato do Brasil ser o país que apresenta maior consumo de pornografia envolvendo mulheres trans e travestis, mas também o que mais as mata.

Uma luta dos LGBTs é contra a onda do conservadorismo aliada a Bolsonaro e grande parcela das igrejas neopentecostais. Pontos que acreditamos terem sido superados voltaram ao debate público como é o caso da cura gay, ou ainda durante as eleições de 2018 em que o Kit anti homofobia tornou-se kit gay. Vereadores aliados ao facínora têm proposto vários projetos de lei proibindo o uso da linguagem neutra, sustentando a sandice da suposta “ideologia de gênero”, numa clara tentativa de impedir o debate sobre diferentes formas de existir.

Tendo em vista todos esses retrocessos e apagamentos entendemos ser essencial o resgate histórico de nossas lutas, entendendo que ser LGBTQIA+ não é apenas por amar, mas ser sujeito digno de respeito e de acesso aos direitos básicos. Muito mais que celebrar nossa existência, devemos partir para a luta, tendo em conta sempre nossas especificidades que abrangem raça e classe.

Nossas cores e letras

LGBTQIAP+ é o movimento político e social que defende a diversidade e busca representatividade e direitos para a comunidade. Cada letra representa a grande variedade de seres que não vivem sob o espectro heterocisnormatividade e usar esta sigla é também um posicionamento político, pois além de incluir novas identidades de gênero e sexualidades, também desloca o poder masculino presente na sigla como a letra G, que antes ditava a norma na comunidade GLS (gays, lésbicas e simpatizantes).

Para lutar contra as opressões sofridas pela comunidade, precisamos entender o que cada letra significa.

L = lésbicas. Mulheres que sentem atração afetiva/sexual por outras mulheres

G = gays. Homens que sentem atração afetiva/sexual por outros homens.

B = bissexuais. Homens, mulheres e pessoas que não se identificam com esses gêneros que sentem atração afetivo/sexual por qualquer gênero.

T = transgênero. Se refere à identidade de gênero, trans em lugar da cis. As pessoas trans podem ser transgênero, travesti, agênero, não-binária ou tantas outras identidades que questionam a cisgenereidade.

Q = queer. Pessoas que transitam entre as noções de gênero. Seu uso é mais comum na América do Norte e é utilizado como termo guarda-chuva de modo que pessoas que questionam a heterossexualidade ou o gênero a reivindicam. A teoria queer questiona o quanto identidades de gênero e sexual possuem relação com uma natureza biológica e as construções sociais.

I = intersexo.  A pessoa intersexo está entre o feminino e o masculino. As suas combinações biológicas e desenvolvimento corporal – cromossomos, genitais, hormônios, etc – não se enquadram na norma binária (masculino ou feminino).

A = assexual. Existem diferentes níveis de assexualidade, que podem passar do repúdio à indiferença em relação ao sexo.

+” = O símbolo de “mais” aparece para incluir outras identidades de gênero e orientações sexuais, tais como: Questionando, Curioso, Aliados, Polissexuais, Familiares, 2-espíritos e Kink.

Sobre a bandeira: A bandeira que adotamos é a bandeira criada em 2018 por Daniel Quasar, uma pessoa não  binária. A nova bandeira possui uma seta direcionado para a direita representando progresso e adicionando 5 cores (branco, rosa, azul, claro, marrom e preto) que são para representar as pessoas trans, negras e pardas da comunidade.

Imagem da bandeira LGBTQIA+.
No lado esquerdo da bandeira, um triângulo com as cores: branco, rosa claro, azul claro, marrom e preto.
Completando a bandeira, listras horizontais nas cores: vermelho, laranja, amarelo, verde, azul e roxo.
Bandeira LGBTQIA+

As novas cores na bandeira nos mostram que não podemos mais recusar as mudanças do movimento e mostrar dentro dele as pessoas que saem dos padrões branco e cisgênero. 

A bandeira é o nosso estandarte do orgulho e, ao balançá-la pelas ruas, mostramos que existimos e que estamos lutando incansavelmente para termos o direito de viver e nos expressar!

A luta anticapitalista e classista LGBTQIA+

Na última pesquisa divulgada pela AGBLT, em 2016, 60% de jovens e adolescentes LGBTQIA+ se sentiam inseguros na escola por causa de sua orientação sexual, 73% já foram agredidos verbalmente, 27% já foram agredidos fisicamente e 56% já foram assediados sexualmente no ambiente escolar. Os números são altos, mas o que torna ainda mais chocante e palpável a LGBTQIA+fobia nas escolas são os comentários registrados nestas e em outras pesquisas e reportagens de crianças, adolescentes e adultos relembrando seus dias escolares – pensamentos suicidas, impotência, incompreensão, medo de colegas, professores e coordenadores, medo de usar o banheiro, exclusão, não reconhecimento de seus nomes sociais e seus pronomes… Diante desta configuração, nos parece óbvio que estas crianças e adolescentes não desejem concluir seus estudos e que se retirem da escola assim que tenham idade suficiente para trabalhar. E aqui não falamos apenas sobre evasão escolar, mas também sobre o que estes jovens carregam consigo para o resto das vidas: a escola é uma das primeiras experiências do ser humano enquanto ser social, e é onde a comunidade LGBTQIA+ descobre ser indesejada pela sociedade e que precisa lutar por sua sobrevivência.

Uma vez que as escolas se apresentam como ambiente tão hostil e suscetível à evasão para pessoas LGBTQIA+, em especial pessoas trans e travestis, estas já iniciam suas vidas profissionais em grande desvantagem no mercado de trabalho, se submetendo a trabalhos precarizados, mal remunerados, informais e/ou que colocam a integridade física e suas vidas em risco constante. A Comissão da Diversidade Sexual da OAB estima que 82% de pessoas trans e travestis tenham abandonado os estudos ainda na Educação Básica; em dossiê da AGBLT lançado em 2021, consta que 90% da população de travestis e mulheres transexuais são profissionais do sexo, sendo a maioria negra e semianalfabeta. Não é à toa que estes números sejam tão próximos. Um país (e um mundo) que reserva tão pouca atenção aos problemas e violências específicas da comunidade LGBTQIA+ não poderia querê-los em outro lugar que não este – um lugar insalubre, cruel, de relações agressivas, sem consentimento ou proteção, invisibilizado e criminalizado, mas ainda assim requisitado. 

É ainda nessa mesma linha de pouco caso do Estado com a vida de pessoas LGBTQIA+, que estas carecem de políticas efetivas de saúde que atendam suas demandas próprias. Em 1988 foi criado o SUS; em 1999 foi criado o Programa Nacional de IST/HIV/AIDS; em 2011 foi instituída a Portaria da Política Nacional de Saúde Integral LGBT (PNSI LGBT); em 2015 foi concluída a produção da PNSI LGBT. Todas estas datas representam um marco do reconhecimento das vulnerabilidades e da atenção específica em saúde que a comunidade LGBTQIA+ precisa (cada letra da sigla e suas intersecções com suas particularidades). Porém, hoje, o ano é 2022 e continuamos a ser atendidos por profissionais preconceituosos, desatualizados e alienados às nossas características. Seguimos com dificuldade em encontrar UBS com atendimento adequado, burocratização em processos transexualizador e hormonização, falta de medicamentos e hormônios, nossa saúde mental não é considerada, entre tantas outras lutas pelo direito a sobreviver e viver com qualidade.

A luta feminista também precisa ser LGBTQIA+

A transfobia é uma realidade existente na sociedade, e também em movimentos sociais. Infelizmente dentro da luta feminista, existem grupos de mulheres que rejeitam participação de mulheres trans, travestis e/ou homens trans, não considerando sua pautas, lutas e pior, colocando estas pessoas como possíveis inimigues do movimento e agressories em potencial.

As Radfem (Feminista Radicais) lutam além do seu espaço na sociedade e direitos, batalham também para exclusão das causas das pessoas trans, o que é um pouco contraditório. As alegações são diversas para essa separação de luta. Há as que dizem que uma mulher trans não pode ser mulher por não ter útero ou que a presença delas afetam a “segurança” de uma mulher cis, como também o fato dos homens trans decidirem passar pela transição para acessar com facilidade os privilégios dos homens cis. Suas pautas são extremamente biologizantes e esquecem até mesmo de mulheres cis que integram o movimento, há aquelas que não menstruam, ou que tiveram seu útero retirado por questões de saúde. Isso as tornaria menos mulher? 

Outro problema relacionado a esse grupo é o incentivo aos discursos de ódio. A escritora JK Rowling (autora da série Harry Potter) é um exemplo muito conhecido por financiar e levantar esses tipos de atos. Os ataques feitos por ela tem ganhado cada vez mais espaço e seguidores, principalmente pelo público jovem que acompanha suas obras. Os argumentos passam por questões como a perda de espaço das mulheres na sociedade, como se o movimento trans fosse uma ameaça maior que o patriarcado em si. Nesse sentido, preferem firmar alianças com lideranças conservadoras a feministas transinclusivas.

A vilanização das pessoas trans ignora a marginalização que esse grupo sofre socialmente, numericamente sendo mais vitimizadas que as mulheres cis. Precisamos, nesse mês do orgulho, abrir espaço para reflexão, mas não encerrar aqui nossa práxis de estudo e luta!

Venceremos!

Assim, entendemos a necessidade de associar a luta LGBT+ à pluralidade real que compõe a sigla, às batalhas das pessoas negras, indígenas, com deficiência, proletárias, nas margens da sociedade.

Não nos querem em casa. Não nos querem na família. Não nos querem na igreja. Não nos querem na política. Não nos querem na escola. Não nos querem na universidade. Não nos querem no trabalho. Não nos querem com saúde. Não nos querem vivos.

Mas nós queremos casa. Queremos família. Queremos fé. Queremos fazer política. Queremos educação básica e superior. Queremos trabalho. Queremos saúde. Queremos vida. Queremos o que quisermos.

E teremos.

Maiara Mendes, Mariana Horlle, Lorrane Carneiro e Thayna Araujo.

REFERÊNCIAS
Sobre subvertacomunica (62 artigos)
Organização Política Ecossocialista que atua para transformar o mundo, acabar com todo tipo de exploração, opressão e destruição do planeta!

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