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Resolução sobre federação com a Rede

Card colorido. Fundo com fotografia de árvores com filtro denso verde escuro. No rodapé texto

Não é momento de arriscar! Porque foi necessária a construção de uma federação do PSOL com a Rede.

No dia 18 de abril de 2022, o PSOL aprovou, com maioria, a consolidação de uma federação com a Rede Sustentabilidade. Esse tema tem polarizado os debates partidários desde o final do ano passado, quando a lei das federações foi aprovada. É importante relembrar que o PSOL, desde o princípio, se posicionou favoravelmente à lei por entender que ela abria uma alternativa para as medidas antidemocráticas de cerceamento da pluralidade partidária, especialmente para os partidos não fisiológicos, medidas essas que vieram no contexto do golpe de 2016 e da reforma política do canalha Eduardo Cunha.

O debate se intensificou na medida em que o TSE regulamentou um calendário muito apertado para a construção das federações partidárias. Temos certeza que o ideal seria um debate mais longo, demorado e profundo sobre o tema, envolvendo mais esferas da base partidária. Porém, o calendário apertado exige da direção nacional do PSOL tomar uma posição sobre o tema dentro de um prazo que permita incidir sobre as movimentações eleitorais de 2022.

Neste sentido, o Subverta organizou sua militância em debates internos e nas instâncias do PSOL, em plenárias e reuniões de diretórios para acumular uma posição sobre o tema. O resultado final destes debates de quatro meses foi uma posição favorável ao PSOL federar com a Rede. Sistematizamos nesta nota as principais razões que nos levaram a essa posição.

O agravamento de uma conjuntura terrível

Estamos em um dos momentos mais terríveis da história do Brasil. Se a situação já estava dramática com uma crise econômica e social que se arrastava há anos, a eleição de Jair Bolsonaro colocou o capitalismo e o Estado brasileiro em uma marcha exponencialmente mais agressiva e violenta sobre os corpos de pessoas da classe trabalhadora, especialmente mulheres, pessoas negras, indígenas, pessoas LGBTQIA+, pessoas com deficiências e sobre a natureza. As condições de vida se tornaram ainda piores com a pandemia de COVID-19 que matou mais de 660 mil pessoas até aqui, junto com uma crise socioeconômica que jogou milhões de brasileires de novo na situação de fome e miséria, cenário que esperávamos que jamais iria se repetir.

No cenário ambiental, a situação é cada vez mais dramática. Para recompor as taxas de lucro frente à crise global capitalista, a burguesia internacional e brasileira têm intensificado a espoliação e destruição da natureza, rompendo com todo um conjunto de legislações e estruturas institucionais dos órgãos ambientais criados para frear os impulsos desenvolvimentistas e preservar florestas, biomas, rios e oceanos.

A resistência popular e de esquerda tem sido fundamental para impedir ainda mais retrocessos. Nas ruas, os movimentos sociais têm pressionado o congresso nacional e o judiciário para frear o avanço da boiada bolsonarista sobre os direitos sociais e da natureza. São movimentos como a Campanha Fora Bolsonaro que têm dado o ritmo da resistência nas cidades. É o movimento indígena que tem sido o protagonista nas florestas, em Brasília e internacionalmente, para denunciar os crimes humanitários de Jair Bolsonaro e mostrar que outro Brasil é possível. É o movimento negro que tem sido mais atingido pela pandemia e que saiu às ruas para exigir “nem bala, nem fome e nem Covid: o povo negro quer viver” contra o aparato estatal que mata e encarcera jovens todos os dias.

Além da ação nas ruas, as ações partidária e parlamentar têm se demonstrado fundamentais na resistência popular. O PSOL é o partido mais ativo e militante na resistência dos movimentos sociais e também no parlamento. Através de nossas parlamentares, obstruímos, denunciamos e desnudamos as medidas nefastas de Bolsonaro que, junto com sua aliança corrupta com o centrão, vem gerando caos e miséria ao povo brasileiro. E é a Rede que, já há alguns anos, é o partido que mais votações têm em comum com o PSOL no congresso nacional.

A prevalência de uma ação tática para garantir a sobrevivência partidária

A cláusula de barreira estabelece normas de acesso dos partidos políticos aos recursos do Fundo Partidário e ao tempo de propaganda eleitoral gratuita na rádio e na televisão. Já em 2022, os partidos precisarão obter 1% dos votos válidos para a câmara federal em 9 unidades da federação diferentes, de forma a totalizar 2% dos votos válidos a nível nacional ou, alternativamente, conseguir eleger 11 deputades federais distribuídes em 9 unidades da federação. Por ser progressiva, em 2026 exige 2,5% de votos válidos a nível nacional e a partir de 2030, 3%. A bancada federal do PSOL dobrou de tamanho entre 2014 e 2018, indo de 5 parlamentares para 10, mas distribuídos em apenas 5 UFs diferentes; nós batemos a cláusula de barreira pelo primeiro critério.

Em 2020, o PSOL foi o partido que mais cresceu dentre os partidos da esquerda brasileira e em 2021, fomos o único partido que aumentou o número de pessoas filiadas. Avaliamos que esses números refletem a confiança e o reconhecimento dos movimentos sociais em nosso partido, como o partido que representa a construção de uma alternativa de país, uma alternativa anticapitalista e livre de toda e qualquer opressão.

Entretanto, o fortalecimento da extrema-direita, aliado ao fortalecimento do Partido dos Trabalhadores a partir da retomada dos direitos políticos de Lula – principal nome atualmente capaz de derrotar o bolsonarismo nas urnas -, eleva o risco do PSOL não ultrapassar a cláusula de barreira, dada a progressividade da regra.

Além disso, é preciso frisar que nossa meta não deve ser apenas manter a viabilidade partidária do PSOL ao superar a cláusula de barreira. Não é sobre manter o pescoço acima da água, mas sobre eleger o maior número possível de parlamentares e conquistar uma boa estrutura para a construção partidária, melhorando as condições de ação para nossa estratégia política como esquerda radical e ecossocialista. Antes da criação das federações, foram proibidas as coligações para eleições proporcionais, de forma que apenas os partidos que conseguirem se federar serão beneficiados pela junção de votos, diferentemente de antes, onde todos os partidos, principalmente os de direita, formavam enormes coligações sem programa nem princípios, com fins unicamente eleitoreiros.

A Rede é um partido de posições democráticas e majoritariamente progressistas e coincidentes com o PSOL no Congresso no último período, além de ter uma atuação importante no Senado, como no caso da CPI da Covid. Tem importante inserção entre o progressismo, o ambientalismo e entre setores do movimento indígena, especialmente no Norte do Brasil. É um partido que está com dificuldade de sobreviver em razão do caráter antidemocrático da legislação da cláusula de barreira. Nessa conjuntura atual de erosão democrática, é importante firmar a federação para garantir que PSOL e Rede ultrapassem a cláusula de barreira, estabelecendo um importante compromisso de solidariedade democrática. Cabe às forças ecossocialistas do PSOL disputar com mais qualidade uma ampliação do ecossocialismo dentro da base e de setores mais à esquerda da Rede. Nesse sentido, relembramos que, assim como no PSOL, há um setor da Rede que compõe a GEN (Global Ecossocialist Network), um espaço internacional prioritário de articulação entre organizações que defendem o ecossocialismo mundo afora. A própria aproximação da Rede com o PSOL gerou deslocamentos de setores mais à direita para sair da Rede, o que demonstra o quão progressivo programaticamente pode ser esse movimento.

Um movimento estratégico para construção de um amplo pólo radical no ambientalismo brasileiro

O movimento ambientalista no Brasil e no mundo cresce a cada ano conforme se agrava a crise climática e ambiental conduzida pela burguesia global. O PSOL e a Rede são os partidos que melhor têm lidado com o crescimento do movimento ambientalista, de maneiras diferentes.

Embora com divergências internas, muitas vezes a atuação na prática da Rede se aproxima daquilo que caracterizamos como capitalismo verde ou ecocapitalismo, ou seja, um programa reformista que coloca a responsabilidade da crise que vivemos no consumo individual, com falhas legislativas e que aposta em empresas e consumidores conscientes como saída. Essa falsa alternativa se coloca hoje globalmente entre os Estados burgueses como consenso, mas sabemos o que seu avanço garantiu: estamos cada dia mais perto de um colapso climático.

Por outro lado, no PSOL, setores expressivos, em sua maioria, têm debatido no sentido da radicalização da pauta ambiental, no sentido do ecossocialismo, buscando derrotar setores do latifúndio, do capitalismo fóssil e do capitalismo verde para realmente frear a brutal exploração da natureza. Se por um lado a busca por reformas e a luta contra os setores mais agressivos à natureza pode unir essas propostas taticamente, sabemos que, em sentido estratégico, é imprescindível que a alternativa apresentada pelo movimento ambiental seja anticapitalista.

Mas essa não é só uma avaliação nossa. A cada ano, o movimento ambientalista global vem se radicalizando, cada vez mais indignado contra as falsas alternativas anualmente apresentadas na COP. No Brasil de Bolsonaro, há ainda mais razões para desconfiar de saídas ecocapitalistas, tanto pela gravidade da situação ambiental sob o fascista quanto pela debilidade de setores da burguesia em apoiar a pauta ambiental ou enfrentar de qualquer forma a sanha ecocida do antigoverno. Mesmo com uma possível eleição de Lula, essa pressão por uma saída ambiental radical não deve ceder, afinal, no atual nível de contradição que se coloca entre capitalismo global e natureza, há cada vez menos espaço para meios-termos. E são nesses momentos que o PSOL deve liderar, junto com os movimentos sociais indígenas e ambientalistas, o processo de politização e radicalização, demonstrando os limites do capitalismo verde, derrotando-o e apontando o ecossocialismo como única saída real frente à barbárie e à possibilidade de extinção. A federação garante um espaço de proximidade entre os partidos, fértil para esse movimento. Essa disputa não será fácil, mas negar sua possibilidade de antemão é abandonar uma trincheira de luta.

Contradições do projeto da Rede e autonomia do PSOL na federação

Não há razões para ter ilusões com o que é a Rede, nem com as contradições que a federação inevitavelmente trará, em especial em seu primeiro ano de existência e nas eleições de 2022. A Rede é um partido de perfil de esquerda progressista moderada, mas com atuação difusa, forte perfil pequeno-burguês, com um programa majoritariamente reformista e muitas vezes com práticas ecocapitalistas. Como exemplo de umas das grandes vacilações que a Rede tomou: sua direção apoiou o golpe de 2016 e sua principal liderança, Marina Silva, apoiou em 2014 Aécio Neves. A Rede também possui pouca coesão interna, que a leva a vacilar perante a conjuntura. Atualmente, isso se expressa em uma indecisão a nível nacional, com setores importantes do partido declarando apoio a Lula, enquanto uma minoria busca apoiar Ciro Gomes; e em uma dispersão a nível estadual, com estados como Roraima e Amapá projetando figuras excelentes, como a liderança indígena Joênia Wapichana e Randolfe Rodrigues, que cumpriu um importantíssimo papel na CPI da Covid, enquanto em Minas Gerais se gesticula abertamente em prol de candidaturas da direita, como Kalil do PSD. Essa fragmentação de posições e construções políticas trarão disputas e contradições para a aliança com o PSOL. A própria legislação da federação, embora permita autonomia desses partidos, faz dela uma autonomia relativa, regida por um Estatuto e comandada por uma direção.

Nossa avaliação é que, na conjuntura atual, é preciso aprovar a federação mesmo frente a esses riscos (menores, ao nosso ver, do que os riscos de não aprová-la) e que, além disso, a federação apresenta oportunidades a curto, médio e longo prazo. A curto prazo, a federação garante a superação da cláusula de barreira em 2022, assim como fortalece as chances de eleição de candidaturas radicais do PSOL, em especial em Pernambuco, Minas Gerais, Pará e Amapá, e, em menor medida, candidaturas progressistas da Rede. A médio prazo, a federação abre um espaço de construção política conjunta, na qual o PSOL terá a maioria na direção da federação e pode atuar para a construção política e programática em direção a defesa do ecossocialismo. A longo prazo, e sob condições mais favoráveis, trata-se da possibilidade de construção de um instrumento estratégico para uma radicalização ecossocialista do ambientalismo brasileiro, de setores do movimento indígena e do progressismo em geral.

A aprovação da federação não garante, a princípio, nenhuma dessas vantagens. Ela apenas coloca as condições para que estas possam ser concretizadas pela prática política a ser empenhada de forma obstinada e resoluta pela direção e pela base do PSOL. Para isso, defendemos que o PSOL busque ao máximo preservar sua autonomia e seu perfil como partido da esquerda radical e, ao mesmo tempo, que busque exercer sua função de maioria da federação, bloqueando eventuais deformações que a aliança com a Rede possa trazer, e puxando, como for possível, a federação à esquerda. Nos estados e municípios, nossa militância deve buscar prevalecer a autonomia do PSOL e seu caráter radical, dentro e fora do período eleitoral. O funcionamento das instâncias de base e direção partidárias não só se manterão como os nossos instrumentos de debate e decisão coletivas, como devem se ampliar para sermos um partido cada vez mais democrático.

Momentos difíceis de erosão democrática exigem de partidos da esquerda radical uma flexibilidade maior, mas também tornam necessária a responsabilidade de nos mantermos vivos e crescendo os instrumentos de luta da classe trabalhadora e dos movimentos sociais. Esses momentos trazem também oportunidades inesperadas pelas quais podemos lutar. Pela sobrevivência do PSOL e pela luta pelo ecossocialismo, apoiamos a federação com a Rede.

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